
Os
números da crise da economia mundial são impressionantes. O PIB dos
EUA encolheu 32,9% no trimestre abril/maio/junho, a uma taxa
anualizada. Foi a maior queda desde a Grande Depressão. Na Alemanha,
motor da economia europeia, o PIB de abril a junho recuou 10,1% em
relação ao trimestre anterior. É a queda trimestral mais acentuada
desde 1970, quando os registros começaram a ser realizados. Se
comparado ao mesmo período do ano passado, o recuo do produto alemão
foi de 11,7%. O PIB da China subiu 3,2% no segundo trimestre na
comparação com o mesmo período de 2019. No confronto com os três
primeiros meses do ano, quando a economia do país parou, a alta foi
de 11,5%. O crescimento chinês no segundo trimestre, baixo para o
seu padrão histórico, destoa do resto do mundo. Mas a China é um
ponto fora da curva, e a “fábrica do mundo”.
No
centro capitalista, não se trata somente de uma crise econômica, é
também uma crise política brutal. Os Estados Unidos, mesmo
usufruindo de todas as vantagens de ser o principal país
imperialista da Terra, enfrentam grandes contradições internas,
porque o seu modelo de desenvolvimento gera imensa desigualdade
social. Pelo menos desde o governo Ronald Reagan (1981/1989), o
estado de bem-estar norte-americano, que já era fraco, foi sendo
paulatinamente destruído. Se estima que atualmente existam mais de
40 milhões de pobres nos EUA. Cerca de 40% dos estadunidenses se
queixam de que não conseguem cobrir despesas inesperadas com
emergências, que ultrapassem 400 dólares. Quase 30 milhões de
pessoas nos EUA (quase 10% da população) vivem na chamada
insegurança alimentar, não têm o suficiente para comer. A exemplo
do Brasil, a insegurança alimentar nos EUA vem aumentando bastante
com a pandemia. Além disso, os EUA têm cerca de 500 mil pessoas em
situação de rua (morando na rua ou em abrigos públicos). A grande
maioria são negros ou latinos.
O
fato de que os EUA tenham um número tão grande na condição de
pobreza representa uma verdadeira bomba-relógio. Uma revolta geral
dos trabalhadores dentro do país imperialista mais rico do mundo
teria um efeito político, econômico e social, simplesmente
imprevisível. Este risco, inclusive, talvez tenha influenciado a
decisão dos EUA, há mais de uma década, de retomar para sua área
de influência os governos da América Latina, naquele momento
ocupados por governos progressistas. A partir de Honduras, em 2009,
os EUA foram derrubando, um a um, todos os governos progressistas
eleitos na América Latina.
Por
conta da crise econômica e dos golpes de Estado, que atingiram quase
todo o continente, a situação política na América Latina é
instável e caracterizada por grande polarização. Com a crise
mundial, para o imperialismo não foi mais possível conviver com
governos reformistas e nacionalistas, que atrapalhavam (ou
atrapalham) as intenções dos EUA no subcontinente. A crise
econômica mundial tornou imperativa uma política geral de guerra
contra o povo. Governos de esquerda, mesmo que moderados, são sempre
obstáculos importantes a implementação deste tipo de política,
mesmo porque chegaram ao poder respaldados pelo voto. Obviamente que
esse tipo de política gera uma instabilidade muito grande, na medida
em que uma parcela expressiva da população (mais consciente) se
nega a seguir para o matadouro, sem reagir.
No
Brasil, os golpistas diziam que era tirar Dilma Rousseff
que o crescimento econômico e os investimentos internacionais
retornariam, como num passe de mágica. Dado o golpe, com a grande
farsa do impeachment, o governo Michel Temer foi um verdadeiro show
de horrores, com entreguismo sem limites e um retumbante fracasso na
economia. Para “fechar” o processo golpista, fraudaram as
eleições de 2018, apoiados numa operação gestada no Departamento
de Estado norte-americano
(cada vez mais desmoralizada pelo oceano de denúncias), entrou
Bolsonaro e a coisa só piorou. Com o advento da pandemia, logo de
saída ficou evidenciado que Bolsonaro é o pior governo da história
do país, uma penitência cruel, que o povo brasileiro jamais
mereceria.
Quando
afirmávamos em 2014, que a Lava Jato nada tinha a ver com corrupção
e que era uma operação do governo estadunidense para roubar
petróleo, água, recursos naturais em geral, biodiversidade da
Amazônia, e para interromper um limitado processo de construção de
um projeto nacional de desenvolvimento, nos acusavam de estar
alimentando uma “teoria da conspiração”. Esses seis ou sete
anos, desde a intensificação da construção do golpe, mostraram
que a conspiração é muito mais grave do que qualquer teorização
do fenômeno. Nessa altura dos acontecimentos as “confissões”
dos crimes cometidos pelos responsáveis pela Lava Jato seria mais do
que suficiente para anular toda a farsa do processo de impeachment. O
fato de que isso não tenha ocorrido mostra que os golpistas ainda
estão no poder (nos vários poderes).
Os
golpes na América Latina, desde o de Honduras, em 2009, possuem dois
eixos comuns: a) desenvolvimento de uma política de guerra contra a
população; b) saqueio da região.
Uma esquerda reformista no poder, por mais moderada que seja,
atrapalha a implementação dos referidos eixos de governo. Um
acontecimento bastante recente, serve para revelar ainda mais a
natureza do processo que se desenvolve na América Latina. Elon
Musk, dono da empresa Tesla e a 5ª pessoa mais rica do mundo,
escreveu em sua conta no Twitter: “Vamos
dar golpe em quem quisermos! Lide com isso”.
A ameaça foi uma resposta a uma postagem enviada ao
bilionário sobre seu objetivo de impedir que o
ex-presidente boliviano Evo Morales continuasse no poder, pelo
interesse no lítio
(chamado de Petróleo Branco, a maior parte das reservas mundiais
estão na Bolívia).
A
descarada confissão do bilionário revela que a América Latina está
sendo, de fato, saqueada por autênticos ladrões. Convictos da
impunidade, não fazem nem mesmo questão de esconder o fato. O
ex-presidente boliviano Evo Morales (2006-2019), golpeado
inapelavelmente pelo império em 2019, denunciou no dia 07/08/20 que
um “novo golpe de Estado” está sendo gestado em seu país,
visando dar poderes absolutos à ditadura de Jeanine Áñez e impedir
que a esquerda volte ao poder, cenário muito provável, se houverem
eleições. Além de apontar os nomes dos golpistas nacionais,
Morales denunciou também a participação dos Estados Unidos, com
consultoria e equipamento bélico para reprimir o movimento popular,
principalmente nas regiões de El Alto e Chapare, onde, segundo
consta, haverá mais resistência ao possível novo golpe de Estado.
Os
golpistas na Bolívia tentaram institucionalizar o processo, através
de novas eleições diretas, nas quais Evo Morales, exilado na
Argentina, não pode concorrer. Eleições totalmente fajutas. Apesar
de tudo, o partido de Evo Morales (MAS), inscreveu um candidato para
as eleições, que aparece bem à frente, nas pesquisas eleitorais.
Em função da grande possibilidade do candidato do MAS vencer as
eleições, mesmo com todas as manobras possíveis, provavelmente
darão um novo golpe. O que acontece na Bolívia segue um script,
que, adaptado em cada país, está sendo seguido em todo o
subcontinente latino-americano.
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